A sagrada vontade total. Porque as coisas ocorrem de certa forma, e quando isso se dá
Capítulo 21
MIRDAD: É estranho que vós, filhos do Tempo e do Espaço, não percebais que o Tempo é a memória universal inscrita nos tabletes do Espaço.
Se vós, limitados como sois pelos sentidos, podeis lembrar-vos de alguma coisa ocorrida entre o nascimento e a morte, quanto o poderá o Tempo, que já era antes de nascerdes e que durará infinitamente após a vossa morte?!
Dir-vos-ei que o Tempo lembra-se de tudo – não só daquilo de que tendes vívidas recordações, como também do que vos passou inteiramente despercebido.
Isso porque não há esquecimento no Tempo; não, jamais o Tempo esquece o mais leve movimento, respiração ou capricho. E tudo que é guardado na memória do Tempo fica profundamente gravado sobre as coisas do Espaço.
A própria terra que pisais, o próprio ar que respirais, as próprias casas em que morais poderiam facilmente revelar-vos os mínimos pormenores do registro de vossas vidas – passada, presente e do porvir – tivésseis vós a capacidade de ler e a perspicácia de entender o sentido.
Na vida, como na morte; na Terra ou além da Terra, jamais estareis sós, mas na constante companhia de seres e coisas que participam de vossa vida e de vossa morte, assim como vós participais da vida e da morte deles. Assim como participais deles, eles participam de vós; assim como os buscais, assim eles vos buscam.
O Homem tem sua conta com todas as coisas, e estas têm sua conta com o Homem. Esse intercâmbio segue sem interrupção. A memória do Homem é um mau guarda-livros; não assim, porém, a perfeita memória do Tempo, que conserva sempre em dia as contas de sua relação com os dos seus contemporâneos e outros seres do Universo e os força a acertar suas contas num piscar de olhos, vida após vida, morte após morte.
O raio jamais feriria a casa se a casa não o atraísse. A casa é tão responsável pela sua ruína quanto o raio.
Um touro jamais chifra um homem se o homem não o convidar a chifrá-lo. E na verdade aquele homem deve responder mais pelo seu sangue do que o boi.
O assassinado afia o punhal do assassino e ambos desferem o golpe fatal.
O roubado dirige os movimentos do ladrão e ambos cometem o roubo.
Sim, o Homem convida as suas próprias calamidades e depois protesta contra os hóspedes importunos, por se haver esquecido quando e como escreveu e enviou os convites. O Tempo, no entanto, jamais esquece; e o Tempo a tempo e horas entrega o convite no endereço certo; e o Tempo conduz cada convidado à casa do anfitrião.
E em verdade vos digo, jamais protesteis contra um hóspede, para que ele não se vingue, demorando-se muito tempo ou tornando as suas visitas mais freqüentes do que seria normal.
Sede bondosos e hospitaleiros para com todos os vossos hóspedes, seja qual for o seu procedimento ou o seu comportamento; pois na realidade são somente vossos credores. Dai aos mais importunos ainda mais do que deveis, para que se vão gratos e satisfeitos e para que, se voltarem a visitar-vos, o façam como amigos e não como credores.
Tratai cada hóspede como hóspede de honra, a fim de que, captando-lhes a confiança, possais descobrir os motivos ocultos de sua visita.
Aceitai a desventura como se fosse ventura, pois uma desventura, uma vez compreendida, logo se transforma em ventura. Por outro lado, a ventura mal compreendida muito em breve se torna desventura.
Vós escolheis o vosso nascimento e a vossa morte, a hora, o local e o modo, não obstante a vossa memória caprichosa, que não é mais do que um emaranhado de falsidades, cheia de buracos e de brechas enormes.
O pretenso sábio declara que os homens não têm qualquer influência em seu nascimento e morte. O indolente que olha de esguelha para o Tempo e o Espaço logo afirma que a maior parte do que sucede no Tempo e no Espaço é acidental. Cuidado com os seus conceitos e as suas ilusões, meus Companheiros.
Nada existe no Tempo e no Espaço que seja acidental. Todas as coisas são ordenadas pela Vontade Total, que em nada erra e nada esquece.
Assim como as gotas de chuva se reúnem nas fontes; e as fontes fluem para se transformarem em riachos, e os riachos em ribeirões; assim como os ribeirões se oferecem como afluentes dos rios maiores e estes, por sua vez, levam as suas águas ao mar, e o mar se junta ao Grande Oceano – assim cada vontade de cada criatura, inanimada ou animada, flui como tributária da Vontade Total.
Em verdade vos digo que tudo tem vontade. Mesmo a pedra, aparentemente tão surda e muda e sem vida, não é isenta de vontade. Se assim fosse, ela em nada influiria e nada a afetaria. A sua consciência de querer e de ser poderá diferir da do homem, em grau, porém não em substância.
De quanto, com referência à vida de um só dia, podereis afirmar que sois conscientes? De uma parte insignificante, na realidade.
Se vós, dotados de cérebro, memória e meios de registrar emoções e pensamentos, ainda sois inconscientes da maior parte da vida de um único dia, porque vos admirais de que uma pedra seja inconsciente de sua vida e sua vontade?
E assim como viveis e vos moveis quase inconscientementes de que estais vivendo e vos movendo, assim também quereis terdes consciência de que estais querendo. Mas a Vontade Total é consciente da vossa inconsciência e da de toda criatura no Universo.
Ao se redistribuir a si mesma como soe suceder a todo instante do Tempo e em todos os pontos do Espaço, a Vontade Total dá a cada homem e a cada coisa aquilo que ele ou ela desejaram nem mais nem menos, quer o tenham querido conscientemente ou não. Os homens, porém, não o sabendo, surpreendem-se freqüentemente com o que lhes toca da sacola da Vontade Total que tudo contém. E os homens protestam, abatidos, desanimados, e culpam os caprichos do Destino.
Não é o Destino, ó monges, que é caprichoso; pois Destino não é mais do que outro nome da Vontade Total. E a vontade do Homem que ainda é muito caprichosa, muito instável e muito incerta no seu curso: hoje corre para o oriente e amanhã para o ocidente; aqui marca isto como sendo bom, e ali decreta que é mau; agora aceita um homem como amigo, e mais tarde o combate como inimigo.
Vossa vontade não deve ser caprichosa, meus Companheiros. Lembrai-vos de que todas as nossas relações com as coisas e os homens são determinadas pelo que quereis deles e pelo que eles querem de vós.
Portanto, já antes vos disse e agora torno a dizer: Tomai cuidado de como respirais, de como falais, do que desejais, do que pensais e fazeis. Porque a vossa vontade está escondida em cada respiração, em cada palavra, em cada desejo, em cada pensamento e em cada ação. E o que está oculto para vós será sempre manifesto à Vontade Total.
Não queirais obter de nenhum homem um prazer que para ele seja uma dor, pois, se o fizerdes, o vosso prazer vos doerá mais do que uma dor.
Nem queirais obter de coisa alguma um bem que para ela seja um mal, pois, se o fizerdes, estareis querendo um mal também para vós.
Mas querei de todos os homens e de todas as coisas o seu amor; pois somente com ele serão levantados vossos véus e a Compreensão nascerá em vosso coração, iniciando-se assim a vossa vontade nos profundos mistérios da Vontade Total.
Enquanto não chegardes a ser conscientes de todas as coisas não podereis ser conscientes da vontade delas em vós, nem de vossa vontade nelas.
Enquanto não fordes conscientes de vossa vontade em todas as coisas, e delas em vossa vontade, não podereis conhecer os mistérios da Vontade Total.
E enquanto não conhecerdes os mistérios da Vontade Total não deveis estabelecer a vossa contra ela; pois certamente sereis vencidos. Saireis de cada encontro feridos e embriagados de fel; e buscareis vingar-vos somente para acrescentardes mais ferimentos aos antigos e fazer transbordar a vossa taça de fel.
Em verdade vos digo, aceitai a Vontade Total, se quereis transformar a derrota em vitória. Aceitai, sem murmurar, todas as coisas que de sua misteriosa sacola caírem sobre vós; aceitai com gratidão, convencidos de que são a vossa parte, justa e perfeita, da Vontade Total. Aceitai-as com vontade de compreender o seu valor e o seu significado.
E quando conseguirdes compreender os caminhos ocultos de vossa própria vontade, tereis compreendido a Vontade Total.
Aceitai o que não sabeis, e talvez isso vos permita vir a saber. Voltai-vos contra o que ignorais, e continuareis a ter ante vós um enigma irritante.
Deixai que a vossa vontade seja serva da Vontade Total até que a Compreensão torne a Vontade Total serva da vossa vontade.
Assim ensinei eu a Noé.
Assim eu agora vos ensino.
O Livro de Mirdad
Autor: Mikhaïl Naimy
Publicado em Bombain, na Índia,
em 1954, pelo Lectorium
Rosicrucianum
Pág. 125, 126, 127, 128 e 129.
Juracy Ribeiro, Sonia Sirolli
Há 15 anos
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