sexta-feira, 30 de abril de 2010

Não é correto matar pra comer?, de O Livro de Mirdad.

 Não é correto matar para comer?

Capítulo 24

Quando Shamadam e o magarefe se haviam retirado, Micayon perguntou ao Mestre:
Micayon: Não é correto, Mestre, matar para comer?



MIRDAD: Alimentar-se da Morte é tornar-se alimento da Morte. Viver da dores alheias é tornar-se presa da dor. Assim o decretou a Vontade Total. Toma conhecimento disto e escolhe o que hás de fazer, Micayon.

Micayon: Se eu pudesse escolher, escolheria viver, como a fênix, do aroma das coisas, não de sua carne.

MIRDAD: Em verdade uma excelente escolha. Crê, Micayon, que dia virá em que os homens viverão do aroma das coisas, que é o seu espírito, e não de sua carne e sangue. E esse dia não está longe para aqueles que almejam.

Os que almejam sabem que a vida da carne nada mais é do que uma ponte para a Vida fora da carne.
Os que almejam sabem que os sentidos grosseiros e inadequados não são mais do que orifícios pelos quais se espia para o mundo dos sentidos infinitamente apurados e adequados.
Os que almejam sabem que toda carne que rasguem, mais cedo ou mais tarde terão que restaurar com sua própria carne; e todo osso que triturem terão que reconstruir com os seus próprios ossos; e cada gota de sangue que derramem, terão que repor com o seu próprio sangue, pois essa é a lei da carne.
E os que almejam se libertarão da escravidão a esta lei. Por isso reduzem as suas necessidades corporais ao mais baixo limite, reduzindo, assim, o seu débito à carne – o qual é, em verdade, um débito à Dor e à Morte.
O que almeja é inibido pela sua própria vontade e anseio; ao passo que o que não almeja espera que os outros o proíbam. Uma infinidade de coisas que são corretas para o que não almeja, são consideradas pelo que almeja como incorretas para ele.
Enquanto o que não almeja procura mais e mais coisas com que possa encher os seus bolsos e seu ventre, o que almeja segue o seu caminho sem ter bolso e com o ventre limpo de sangue e das convulsões de qualquer criatura.
O que aquele que não almeja ganha – ou pensa ganhar – no fim aquele que almeja ganha na leveza de espírito e na doçura da compreensão.
De dois homens que olham para um campo verdejante, um deles calcula o preço das medidas do grão em prata e ouro; o outro bebe a linda cor verde do campo com os olhos, e confraterniza sua alma com todas as radículas das plantas e todos pequeninos seixos existentes no mínimo torrão de terra.
Em verdade vos digo que este é o legítimo dono daquele campo, enquanto o outro só o possui em arrendamento.
De dois homens sentados em uma casa, um deles é o proprietário e o outro somente hóspede. O proprietário discorre prolixamente sobre o custo do prédio e de sua manutenção, sobre o valor das cortinas e dos tapetes, da mobília e de outros utensílios. Enquanto isso, o hóspede abençoa em seu coração as mãos que lavraram as pedras, afeiçoaram e construíram a casa; as mãos que teceram os tapetes e as cortinas; as mãos que invadiram a floresta e a transformaram em janelas, portas, cadeiras e mesas. E o seu espírito se exalta à Mão Criadora que causou a existência de tudo isto.
Em verdade vos digo que o hóspede é o habitante permanente daquela casa; enquanto o proprietário nominal é só uma besta de carga que a carrega nas costas, porém não mora nela.
De dois homens que compartilham com um bezerro o leite da mãe deste, um olha para o bezerro com o pensamento de que sua carne tenra daria um bom assado para ele e seus amigos comemorarem o seu próximo aniversário; o outro pensa no bezerro como seu irmão de leite e está repleto de amor pelo animalzinho e por sua mãe.
Em verdade vos digo que o segundo é realmente alimentado pela carne daquele bezerro; enquanto que o primeiro é por ela envenenado.
Sim, companheiros, há muita coisa que deveria entrar no coração, e no entanto, entra no estômago.
Muita coisa entra no bolso e na despensa, quando deveriam ser esmagadas pela mente.
É muito pouco aquilo de que o corpo precisa para sustentar-se. Quanto menos lhe derdes, menos ele vos dará de volta.
Em verdade vos digo que as coisas que não vão para a vossa despensa nem para o vosso estômago, vos nutrem muito mais do que aquelas que vão para a despensa e o estômago.
Uma vez que ainda não podeis viver somente da fragrância das coisas, tomai sem receio aquilo de que necessitais – porém não mais do que necessitais, -- do generoso coração da Terra, pois a Terra é tão hospitaleira e amorosa que seu coração está sempre aberto para os seus filhos.
Como poderia ser a Terra de outro modo e onde poderia ela ir, fora de si mesma, para alimentar-se? A Terra precisa alimentar a Terra e a Terra não é uma anfitriã avarenta, pois a sua mesa está sempre posta em abundância para todos.
Da mesma maneira que a Terra vos convida a participar de sua mesa, nada retendo fora de vosso alcance, da mesma maneira deveis convidar a Terra para a vossa mesa e dizer-lhe com o maior amor e sinceridade:
“Oh mãe inexprimível! Assim como tu expões o teu coração diante de mim para que eu tome aquilo de que necessitar, ponho eu meu coração diante de ti para que tomes aquilo de que necessitares.”
Se for esse o espírito que vos guia ao comerdes do coração da Terra, então pouco importa o que comais.
E se for esse, realmente, o espírito que vos guia, então tereis sabedoria bastante e amor bastante para não privardes a Terra de nenhum de seus filhos, especialmente daqueles que vieram para sentir o prazer de viver e a dor de morrer – aqueles que acabam de chegar ao segmento da Dualidade, pois eles também tem um caminho a seguir, vagaroso e trabalhoso, para a Unidade. E a sua estrada é mais longa do que a vossa. Se os detiverdes em sua marcha, eles vos deterão em vossa caminhada.

Abimar: Já que todas as coisas vivas têm que morrer, por uma ou por outra causa, porque devo eu ter escrúpulos em ser a causa da morte de qualquer animal?

MIRDAD: Conquanto seja verdade que tudo quanto é vivo está condenado à morte, mesmo assim é maldito aquele que causa a morte de qualquer coisa viva.
Assim como tu não me encarregarias de matar Naronda, sabendo que eu o amo muito e que não há desejo de sangue em meu coração, também a Vontade Total não encarregaria um homem de matar outro homem ou animal, a não ser que o considerasse apto como instrumento de morte.
Enquanto os homens forem o que são, haverá furtos e roubos entre eles, e mentiras e guerras e assassínios e toda sorte de paixões negras e vis.
Mas desgraçados serão o gatuno e o ladrão; e desgraçado será o mentiroso e o senhor da guerra, e o assassino e todo homem que aninhar em seu coração paixões negras e vis, pois eles, estando repleto de desgraça, serão usados pela Vontade Total como mensageiros da desgraça.
Mas vós, meus Companheiros, deveis limpar os vossos corações de toda paixão negra e má para que a Vontade Total vos ache preparados a levar ao mundo sofredor a alegre mensagem da redenção do sofrimento; a mensagem daqueles que se libertaram; a mensagem da Libertação através do Amor e da Compreensão.
Assim ensinei eu a Noé.
Assim eu agora vos ensino.

Autor: Mikhail Naimy.
O Livro de Mirdad. Pág. 145, 146, 147, 148 e 149.
Traduzido da edição em inglês – por alunos do Lectorium Rosicrucianum -
Publicada em 1954 por N.M. Tripathi LTD., Bombaim– Índia.

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