sexta-feira, 30 de abril de 2010

da oração, O Livro de Mirdad

Bennoon: Que dizeis da oração, Mestre Mirdad? Na oração nos fazem dizer palavras demais e  pedir coisas em excesso. No entanto, raramente obtemos aquilo que pedimos.
                                                                                                                 
da oração                                                                                                        

capítulo 13

MIRDAD: Orais em vão quando dirigis a quaisquer outros deuses que não a vós mesmos, pois em vós está o poder de atrair, e em vós, o poder de repelir.
                  E em vós está aquilo que atraireis e em vós está aquilo que repelireis, pois poder receber algo é poder dar isso mesmo.
                 Onde há fome há alimento. Onde há alimento necessariamente há fome. Sofrer a dor da fome é ter a alegria de gozar da bênção de ser farto.
                 Sim, na necessidade está o suprimento da necessidade.
                 Não é a chave uma garantia para a fechadura?
                 E não é a fechadura uma garantia para a chave? Não são ambas, a fechadura e a chave, uma garantia para a porta?
                 Não tenhais pressa em importunar o serralheiro cada vez que não souberdes onde puseste a chave. O serralheiro fez a sua tarefa e a fez bem; não se deve pedir que torne a fazê-la constantemente. Fazei o vosso trabalho e deixai em paz o serralheiro; pois ele, depois de vos ter servido, tem mais o que fazer. Retirai o mau cheiro e o lixo de vossa memória e certamente encontrareis a chave.
                  Quando Deus, o impronunciável vos pronunciou, Ele se pronunciou em vós. Vós, portanto, também sois impronunciáveis.
                   Deus não vos dotou de nenhuma fração de Si -- pois Ele é indivisível; -- mas de toda sua divindade, indivisível, impronunciável Ele vos dotou a vós todos. Que maior herança podeis vós aspirar?
E quem ou o que vos impede de apossardes dela senão a vossa própria timidez e cegueira?
                   E em vez de serem gratos por essa herança e em vez de procurarem os meios de tomarem posse dela, alguns homens -- cegos e ingratos! -- fazem de Deus uma espécie de quarto de despejo ao qual levam suas dores de dentes e barriga, seus prejuizos nos negócios, suas brigas, suas vinganças e suas noites de insônia.
                   Enquanto outros fazem de Deus sua casa do tesouro onde esperam encontrar o que desejam toda vez que cobiçam a posse de todos os pechisbeques deste mundo.
                   Há ainda outros que fazem de Deus uma espécie de seu guarda-livros particular. Pretendem que Deus deva não só manter em dia as contas de suas dívidas, mas também cobre o que lhes é devido, conseguindo sempre um grande saldo a favor deles.
                   Sim, são muitas e diversas as tarefas que os homens exigem de Deus. No entanto, poucos se lembram de que se isso estivesse a cargo de Deus, Ele as executaria sozinho e não precisaria de homem algum para incitá-Lo a fazê-las ou L'has recordar.
                   Por acaso relembrais a Deus das horas em que deve nascer o sol ou pôr-se a lua?                  Lembrais a Deus de fazer brotar da terra o grão de milho naquele campo? Tendes que lembrá-Lo para que aquela aranha acolá teça a sua teia? Precisas lembrá-Lo dos filhotes do pardal naquele ninho ali? Por acaso tendes de lembrá-Lo das inúmeras coisas que enchem este infinito universo?
                   Por que fazeis pressão com vossos insignificantes seres, em Sua memória? Sois menos favorecidos em Sua vista do que os pardais, o milho e as aranhas? Por que, como eles, não recebeis os vossos presentes e não vos ocupais com vossas tarefas sem muito alarido, sem dobramentos de joelhos, e extensão de braços e sem ficardes ansiosos a espiar o amanhã?
                   E onde está Deus para que preciseis gritar nos seus ouvidos os vossos caprichos e as vossas vaidades, vossos louvores, vossas queixas? Não está Ele em vós e em tudo ao redor de vós? Não está o  Seu ouvido muito mais próximo de vossa boca do que o está vossa língua do vosso céu da boca?
                   Basta a Deus a Sua divindade, da qual tendes a semente.
                   Se Deus, tendo-vos dado a semente de Sua divindade, tivesse que cuidar dela ao invés de vós, qual seria a vossa virtude? E qual seria o trabalho de vossa vida? E se vós não tiverdes trabalho algum a executar, mas Deus precisar executá-lo para vós, que sentido terá, então, a vossa vida? E de que valerão todas as vossas preces?
                   Não leveis a Deus as vossas inúmeras preocupações e esperanças. Não Lhe peçais para abrir as portas das quais Ele vos deu as chaves. Mas buscai-as na vastidão de vossos corações, pois na vastidão do coração se encontra a chave de todas as portas. E na vastidão do coração estão todas as coisas pelas quais tendes sede e fome, sejam do bem ou do mal.
                   Um poderoso exército aguarda o vosso chamado e atenderá imediatamente ao vosso mais leve apelo. Quando devidamente equipado, sabiamente disciplinado e corajosamente comandado, poderá saltar eternidades e destruir todas as barreiras que se opuserem ao seu ideal. Quando mal equipado, indisciplinado e timidamente comandado, ele ficará vagando inutilmente ou se retirará com rapidez diante do menor obstáculo, arrastando atrás de si a mais negra derrota.
                     E não é outro esse exército, ó monges, que aqueles diminutos corpúsculos vermelhos que estão agora, silenciosamente, a circular em vossas veias; cada um deles um milagre de força, cada um deles um registro completo e exato de toda vossa vida e de toda Vida nos seus mais ínfimos pormenores.
                     É no coração que este exército se reúne, pois o coração é que faz o seu treinamento. Eis porque é o coração tão famoso e tão reverenciado. Dele brotam as vossas lágrimas de alegria e de tristeza. A ele acorrem os vossos temores da Vida e da Morte. Vossos anseios e vossos desejos são o equipamento desse exército. Vossa Mente é que o disciplina. Vossa Vontade, seu instrutor e comandante.
                     Quando sois capazes de equipar o vosso sangue com um Desejo-Mestre que silencia e ultrapassa todos os desejos; e entregais a um Pensamento-Mestre a disciplina; e encarregais uma Vontade-Mestrado treinamento e do comando, então por certo vereis realizado esse desejo.
                      Como o santo atinge a Santidade, senão eliminando de sua corrente sanguinea todo desejo e todo pensamento incompatível com a santidade e depois dirigindo-o com uma vontade determinadora a nada mais buscar senão a santidade?
                       Em verdade vos digo que todos os desejos santos e todos os pensamentos santos, de Adão até hoje, correrão a ajudar o homem assim inclinado a atingir a Santidade, pois sempre foi assim que em toda parte as águas procuram o mar e os raios de sol procuram o Sol.
                       Como é que o assassino executa os seus planos senão chicoteando o seu sangue até que este adquira uma sede insana de assassínio e reunindo as células deste sangue em fileiras cerradas sob o látego de um pensamento-mestre assassino e comandado com uma vontade incansável de desferir o golpe mortal?
                       Em verdade vos digo que todo assassino, desde Caim até hoje correrá sem que seja chamado para dar força e firmeza ao braço do homem que está embriagado com o assassínio, pois sempre foi assim, que os corvos se associam aos corvos e as hienas se juntam às hienas.
                       Orar, pois, é infundir no sangue um Desejo-Mestre, uma Vontade-Mestra. É, pois, afinar o eu para que fique em perfeita harmonia com o objetivo da prece.
                       A atmosfera deste planeta, refletida com todos os seus pormenores, dentro de vossos corações, está fervendo com as memórias de todas as coisas que testemunhou desde o seu nascimento.
                       Nenhuma palavra ou ação; nenhum desejo ou suspiro;  nenhum pensamento passageiro ou sonho transitório; nenhuma aspiração de homem ou animal; nenhuma sombra, nenhuma ilusão há, que nela não tenha registrado até hoje o seu curso místico e assim farão pelos séculos dos séculos. Afinai o vosso coração a qualquer um deles e ele certamente corrrerá a tocá-lo nas cordas assim afinadas.
                       Para orardes não precisais de língua nem de lábios. Mas antes necessitais de um coração silencioso e desperto; de um Desejo-Mestre e, acima de tudo de uma Vontade-Mestra que não duvide nem hesite, pois as palavras de nada valem se o coração não estiver presente e desperto, melhor é que a língua durma ou que se esconda atrás dos lábios fechados.
                       Nem precisais de templos para neles morardes. Quem não pode encontrar um templo em seu coração, jamais encontrará seu coração num templo. No entanto, estas coisas vos digo, a vós e aos que são como vós, não, porém, a todos os homens, pois a maioria dos homens ainda são como náufragos. Sentem a necessidade de orar, porém não sabe como fazê-lo. Não podem orar senão com palavras e não encontrarão as palavras se vós não as puserdes nos seus lábios. E sentem-se perdidos e apavorados quando se os faz percorrer a vastidão de seus corações, mas se acham sossegados e confortados entre as paredes dos templos e nas multidões de criaturas com eles.
                       Deixai-os erigir os seus templos. Deixai-os recitar as suas preces.
                       Mas a vós e a todos os homens eu rogo que oreis pela Compreensão. Qualquer desejo que não seja este, jamais será cumprido.
                       Lembrai-vos de que a chave da Vida é a Palavra Criadora. A chave da Palavra Criadora é o Amor. A chave do Amor é a Compreensão. Enchei os vossos corações com estas e poupai às vossas mentes o peso de muitas orações; livrai vossos corações da ligação a todos os deuses que vos escravizarão com uma dádiva; que vos acariciarão com uma das mãos para vos destruir com a outra; que estão satisfeitos e bondosos quando os louvais, cheios de ódio e vingativos quando censurados; que vos não ouvem senão quando os chamais e que nada vos dão se não lhes implorardes, que vos tendo dado frequentemente se arrependem de o terem feito; cujo incenso são as vossas lágrimas; cuja glória é a vossa vergonha.
                       Sim, livrai os vossos corações de todos estes deuses para que possais neles encontrar o único Deus que tendo vos enchido com Ele mesmo, vos terá cheios para sempre.

Bennoon: Às vezes falais do Homem como onipotente e às vezes falais dele como um abandonado. Desse modo deixai-nos confusos.


O LIVRO DE MIRDAD

Autor: Mikhaïl Naimy

Publicado em Bombain, na Índia,
em 1954, pelo Lectorium Rosicrucianum
Págs. 87, 88, 89, 90, 91 e 92.

Capa de O Livro de Mirdad



       

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